Organismos Internacionais como Fonte de Financiamento da ESG (Environmental, Social and Governance)

Dra. Vivian Azevedo Rodrigues – Advogada na Chimicatti Advogados

ESG (Environmental, social and Governance), sigla em inglês para Meio Ambiente, Social e Governança, constitui-se como um conjunto de critérios norteadores para a consecução de práticas empresariais responsáveis e em consonância com os atuais valores mundialmente estabelecidos para salvaguarda do meio ambiente e o desenvolvimento sustentável por meio de uma adequada e responsável política de governança corporativa global.

O conceito de ESG permite a avaliação do desempenho de uma organização não apenas sob o aspecto financeiro, mas também em relação ao impacto ambiental, ao compromisso social e à estrutura de governança.

A adoção de práticas ESG, além de contribuir para a construção de uma sociedade mais justa e sustentável, também está associada a uma gestão de riscos mais robusta e à valorização das empresas no longo prazo, em consonância com os matizes Constitucionais.

A necessidade de implementação das práticas ESG implica necessariamente na captação de recursos para seu desenvolvimento e inserção. Nesse prisma, organismos internacionais desempenham um papel fundamental ao fornecerem financiamento e suporte técnico para promoção de projetos sustentáveis, especialmente em países em desenvolvimento.

Embora atualmente em destaque, o termo ESG não é novo, tendo surgido pela primeira vez em 2004, no relatório “Who Cares Wins”, fruto de uma parceria entre o Pacto Global da ONU e o Banco Mundial.

O referido relatório destacou a necessidade de incorporar fatores ambientais, sociais e de governança nas decisões de investimento, visando a construção de um sistema financeiro mais estável e sustentável. Desde então, o conceito ESG evoluiu e tornou-se um critério fundamental na análise de risco e retorno de investimentos.

A evolução histórica do ESG está intrinsicamente ligada a marcos importantes, como a criação dos Princípios para o Investimento Responsável (PRI) em 2005, a fundação do Sustainability Accounting Standards Board (SASB) em 2011 e o lançamento da Agenda 2030 da ONU com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) em 2015.

As práticas ESG e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), compartilham o propósito de promoção do desenvolvimento sustentável e inclusivo em escala global.

Enquanto os ODS fornecem um framework amplo e direcionado a governos e organizações para erradicar a pobreza, proteger o planeta e garantir paz e prosperidade, as práticas ESG aplicam esses princípios ao contexto corporativo, incentivando empresas a adotarem políticas e práticas que contribuam para esses objetivos.

É o que se extrai, por exemplo, do ODS 13, que trata da Ação Contra a Mudança Global do Clima, 8, que promove trabalho decente e crescimento econômico e 16, que visa promover instituições eficazes, responsáveis e inclusivas.

Esses marcos trouxeram para o debate global a necessidade de uma integração mais profunda entre as práticas empresariais e a sustentabilidade, refletindo preocupações que já estavam presentes na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. A norma do artigo 225 da Constituição já estabelecia que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”, criando um fundamento jurídico sólido para a implementação de práticas ESG no país.

Vê-se que a incorporação dos critérios ESG é atualmente essencial não apenas para atender às expectativas de investidores e consumidores, mas também para contribuir com o alcance do desenvolvimento sustentável global, com a adequada mitigação de riscos, uma vez que empresas que adotam práticas ESG tendem a apresentar uma melhor performance financeira a longo prazo, além de reduzirem o risco de litígios e danos reputacionais.

A própria Constituição brasileira, em seu artigo 170, incisos VI e VIII, define a defesa do meio ambiente e a busca pelo pleno emprego como princípios da ordem econômica, evidenciando a importância da sustentabilidade e da responsabilidade social na condução da atividade econômica.

Em 2020, a BlackRock, a maior gestora de ativos do mundo, anunciou que integraria critérios ESG em todo o seu portfólio, demonstrando o crescente compromisso de investidores institucionais com a sustentabilidade. Além disso, o aumento na emissão de títulos verdes e sociais, como os green bonds e os social bonds, reflete a demanda crescente por investimentos que promovam impactos positivos para a sociedade e o meio ambiente.

No contexto brasileiro, a adoção de práticas ESG também se mostra estratégica. Instituições financeiras, como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), têm oferecido linhas de crédito voltadas para projetos sustentáveis. Além disso, a legislação brasileira começa a incorporar aspectos ESG, como a Resolução nº 4.327/2014 do Conselho Monetário Nacional, que obriga instituições financeiras a estabelecer políticas de responsabilidade socioambiental.

Embora absolutamente necessária a implementação de práticas exige necessariamente investimentos significativos em tecnologia, infraestrutura e treinamento.

Organismos internacionais, como o Banco Mundial, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e a Corporação Financeira Internacional (IFC), desempenham um papel crucial ao oferecerem linhas de crédito, garantias e assistência técnica para projetos que visam à sustentabilidade, em consonância ao que estabelece a norma do artigo 218, da Constituição da República, ao preconizar o incentivo ao desenvolvimento científico e tecnológico, como essencial para a inovação e implementação de práticas sustentáveis.

Esses financiamentos internacionais ajudam a mitigar as barreiras financeiras. Tais recursos são especialmente importantes em países emergentes, onde a falta de infraestrutura e a instabilidade econômica podem representar obstáculos significativos.

Além disso, o acesso a financiamentos internacionais pode atrair investimentos externos, ao promover a transferência de tecnologia e estimular o desenvolvimento de novas capacidades industriais e operacionais.

Em nível nacional importantes iniciativas estão sendo frequentemente estimuladas através de importantes Políticas Públicas. A Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/1981) e a Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/2010) são exemplos de legislações que estabelecem diretrizes claras para a atuação das empresas em consonância com os princípios ESG, reforçando a necessidade de financiamento adequado para a implementação dessas práticas.

Cumpre frisar que a obtenção de financiamento internacional requer conformidade com uma série de requisitos e regulamentações que muitas vezes excedem as exigências locais. Isso inclui o cumprimento de políticas de salvaguardas ambientais e sociais, a transparência na utilização dos recursos e a prestação de contas aos financiadores, o que, usualmente, conclama a necessidade de uma adequada assessoria jurídica.

Com efeito, embora a obtenção de financiamento ESG por organismos internacionais propicie os recursos necessários para a implementação de projetos sustentáveis, ele também estabelece um conjunto de exigências jurídicas que influenciam diretamente a governança corporativa e as políticas públicas dos países beneficiários. A conformidade com as políticas de salvaguardas dos financiadores internacionais, por exemplo, é um requisito essencial para a aprovação e execução de projetos.

As políticas de salvaguarda incluem diretrizes rigorosas sobre a proteção ambiental, os direitos sociais e a transparência na governança. Empresas que buscam acessar esses financiamentos precisam estar preparadas para demonstrar conformidade com essas exigências, o que pode exigir a adoção de novas práticas e processos internos.

Noutro giro, a adequada conformidade com as exigências para obtenção de financiamentos internacionais contribui também para o fortalecimento do arcabouço regulatório nacional, criando um ambiente mais favorável, transparente e seguro ao concomitantemente impulsionar o desenvolvimento sustentável. Oportuno frisar que o artigo 5º da Constituição da República, ao assegurar o direito à informação, e o artigo 37, que trata dos princípios da administração pública, reforçam a necessidade de transparência e prestação de contas e a simbiose entre os setores público e privado, como aspectos centrais para a governança ESG.

Nesse sentido, a Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011) desempenha um papel crucial ao garantir a transparência e a publicidade dos atos governamentais, facilitando o monitoramento e a prestação de contas de projetos financiados por organismos internacionais.

Os mecanismos de financiamento para implantação das práticas ESG são múltiplos e podem incluir empréstimos, garantias, subsídios e/ou investimentos diretos.

No Brasil, o BNDES tem desempenhado um papel fundamental no apoio a projetos sustentáveis por meio de programas como o BNDES Finame Baixo Carbono e o Programa ABC, voltado para a agricultura de baixa emissão de carbono. Além disso, a emissão de títulos verdes no mercado doméstico e internacional tem se consolidado como uma importante ferramenta para captar recursos destinados a projetos sustentáveis.

Já, em nível internacional, o Banco Mundial, o BID e o Banco Europeu de Investimento (BEI) oferecem uma ampla gama de produtos financeiros para apoiar projetos que promovem a mitigação e adaptação às mudanças climáticas, a eficiência energética e a inclusão social. O Fundo Verde para o Clima (GCF) é outro exemplo de fonte de financiamento que visa apoiar países em desenvolvimento na implementação de práticas sustentáveis.

A emissão de green bonds e social bonds também se destaca como uma das principais fontes de financiamento internacional para projetos ESG. Esses títulos permitem que empresas e governos captem recursos no mercado financeiro global para financiar projetos que gerem benefícios ambientais ou sociais. A regulamentação desses títulos, ainda em constante desenvolvimento, oferece um grau adicional de transparência e credibilidade aos investidores.

No Brasil, a Lei federal nº 13.800/2019, que dispõe sobre a criação de fundos patrimoniais, já é adotada como base para a captação e gestão de recursos destinados a projetos ESG, reforçando a possibilidade de financiamento privado para iniciativas sustentáveis.

Percebe-se que a integração dos critérios ESG nas estratégias empresariais e nas políticas públicas é fundamental para enfrentar os desafios globais de sustentabilidade e desenvolvimento econômico inclusivo. Organismos internacionais, ao fornecerem financiamento e suporte técnico, não apenas viabilizam a implementação dessas práticas, mas também influenciam o desenvolvimento jurídico e regulatório dos países receptores.

O financiamento nacional e internacional voltado para práticas ESG é uma oportunidade para alinhar países e empresas aos objetivos globais de sustentabilidade, promovendo a modernização do arcabouço regulatório e a construção de uma economia de baixo carbono e mais justa. No entanto, é essencial que esses recursos sejam utilizados de forma transparente e eficiente, garantindo que os benefícios sejam amplamente compartilhados e contribuam para o desenvolvimento sustentável de longo prazo.

As implicações jurídicas e regulatórias associadas ao financiamento ESG exigem uma abordagem integrada e proativa, que considere tanto as exigências internacionais quanto as necessidades locais, assegurando a conformidade e a eficácia das políticas implementadas.

Dessa forma, a colaboração entre governos, empresas e organismos internacionais é vital para mobilizar os recursos necessários e implementar políticas e práticas que promovam a sustentabilidade ambiental, social e de governança, garantindo um futuro mais sustentável e equitativo para todos.